Quarta-feira, 30 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 1 de março de 2023
O cantor e compositor Chico Buarque e o deputado federal Eduardo Bolsonaro ficarão frente a frente na audiência do processo que o artista move contra o político por uso indevido da música “Roda Viva”.
A informação é do advogado do cantor, João Tancredo, que confirmou ainda a data do encontro, dia 27 de julho – no 6º Juizado Especial Cível da Comarca da Lagoa, no Rio de Janeiro – , para o portal de notícias G1. “Eles ficarão frente a frente. Em juizado, as partes têm que comparecer presencialmente”, informou Tancredo.
No dia 16 de dezembro, o juiz Fernando Rocha Lovisi, que está à frente do caso, concedeu a tutela antecipada de urgência para que Eduardo Bolsonaro retirasse a música do post em que ela foi usada.
“Defiro a tutela de urgência para imediata retirada da veiculação da música de Chico Buarque na postagem de URL mencionada na petição inicial, com a fundamentação de estarem presentes os pressupostos legais, sob pena de multa diária no valor de R$1 mil”, escreveu o magistrado na sua decisão.
Antes disso, o cantor passou por uma situação peculiar ao ter duas ações negadas pela juíza substituta Monica Ribeiro Teixeira, sob a justificativa de que o pedido seria indeferido por falta de comprovação de autoria de “Roda Viva”.
A ação em curso, protocolada pelo advogado João Tancredo, pede ainda uma indenização no valor de R$ 48 mil e a publicação da sentença condenatória na mesma rede social em que foi feito o uso indevido da obra.
Polêmica judicial
No final de novembro, Chico Buarque já havia feito o mesmo pedido ao 6º Juizado Especial Cível da Comarca da Capital Lagoa, mas a juíza substituta Monica Ribeiro Teixeira indeferiu o pedido alegando falta de comprovação de autoria de “Roda Viva”.
O advogado João Tancredo entrou com um recurso, mas o mesmo voltou a ser negado sem análise do mérito.
“Roda Viva” foi composta em 1967, e apresentada ao público no III Festival da Música Popular Brasileira, que só aceitava canções originais e inéditas. No ano seguinte, ela inspirou peça teatral homônima de Chico Buarque, e que foi encenada pelo Teatro Oficina, de José Celso Martinez Corrêa.
A canção aparece creditada a Chico Buarque no Dicionário de Música Popular Brasileira Cravo Albin e no “Escritório Central de Arrecadação e Distribuição”, o Ecad.
Caso de análise
A confusão virou também um caso de análise no meio jurídico. Isso porque, segundo especialistas, leis, ritos processuais e encaminhamentos não foram respeitados e acarretaram uma situação esdrúxula.
É o que explica o mestre em Direito Civil e professor universitário Leonardo Ribeiro da Luz, que evoca o artigo 374 do Código de Processo Civil (CPC) para lembrar que não há necessidade de comprovação de autoria em fatos públicos e notórios.
“Me parece um erro, e um erro grosseiro, já que é público e notório que o Chico Buarque é autor de ‘Roda Viva’. Mas, mesmo que a magistrada entendesse não estar provado, ela poderia ter aberto prazo de prova, ter determinado a emenda à inicial para que fosse cumprida essa exigência. Ao negar a ação e o recurso, ela erra duas vezes, já que condiciona uma decisão de mérito a essa comprovação, e leva à extinção do processo. Esse é o pior desfecho possível, já que desobedece o princípio do CPC atual, que diz que, sempre que possível, devemos dar preferência à decisão com análise do mérito, fazendo coisa julgada”, diz.
A advogada especialista em entretenimento, direito autoral e propriedade intelectual Deborah Sztajnberg faz coro e lembra ainda que um juizado especial, também conhecido popularmente como de pequenas causas, não comporta a ação probatória.
“A Lei 9.099 estabelece que juizados especiais não comportam questões probatórias, são para causas rápidas, de fácil julgamento, como era o pedido do Chico Buarque. Quando ela exige uma prova, e prova de algo óbvio, ela mesma determina a extinção do processo. Me parece coisa de quem não quer julgar ação”, ressalta Deborah, que é autora de “O show não pode parar: Direito do Entretenimento no Brasil”.
Ela pontua ainda que um juiz especial, quando quer comprovar algo simples de uma ação analisada por ele, tem recursos que possibilitam a ajudá-lo a decidir.
“Vamos cogitar que ela não conheça ‘Roda viva’, ela poderia dar um Google e ler sobre a história da música, que originou ainda uma peça teatral. No Google, ela poderia ainda ver a infinidade de teses de doutorado e mestrado que citam a música e a creditam ao Chico Buarque. Poderia ver que já teve até questão do Enem com ‘Roda viva’. Ela poderia ainda ligar para o Ecad e pedir um relatório de arrecadação dos royalties e ver que o Chico é o beneficiário deles há mais de 40 anos por ser o autor da música, ou ainda pedir um relatório à Receita Federal sobre a declaração desses mesmos ganhos com o royalties da música”, enumera. As informações são do portal de notícias G1.