Sexta-feira, 19 de abril de 2024
Por Redação O Sul | 26 de agosto de 2017
Publicada no Diário Oficial da última quinta-feira (24) sem alarde, a extinção da Renca (Reserva Nacional do Cobre e Associados), na Amazônia, surpreendeu muita gente e ganhou machetes alarmadas no Brasil e nos principais jornais do mundo.
Não foi o que ocorreu com investidores e empresas de mineração canadenses. Em março, cinco meses antes do anúncio oficial do governo, o ministro de Minas e Energia Fernando Coelho Filho anunciou a empresários do país que a área de preservação amazônica seria extinta, e que sua exploração seria leiloada entre empresas privadas.
O fim da Renca foi apresentado pelo governo Temer durante o evento PDAC (Prospectors and Developers Association of Canada), em Toronto, junto a um pacote de medidas de reformulação do setor mineral brasileiro, que inclui a criação de Agência Nacional de Mineração e outras iniciativas para estimular o setor.
Segundo a pasta, esta foi a primeira vez em 15 anos em que um ministro de Minas e Energia brasileiro participava do evento, descrito pelo governo brasileiro como uma oportunidade para “abordar o aprimoramento na legislação brasileira e também demonstrar os planos do governo para incentivar o investimento estrangeiro no setor”. De outro lado, movimentos sociais, ambientalistas e centros de pesquisa dizem que não haviam sido informados sobre a extinção da Renca até o anúncio da última quinta-feira.
O Canadá é um importante explorador de recursos minerais no Brasil e vem ampliando este interesse desde o início do ano. Hoje, aproximadamente 30 empresas do país já exploram minérios em território brasileiro – especialmente o ouro, que teria atraído garimpeiros à área da Renca nos últimos anos.
Em junho, dois meses antes da extinção oficial da reserva amazônica, a Câmara de Comércio Brasil-Canadá anunciou uma nova Comissão de Mineração, específica para negócios no Brasil, que reúne representantes destas 30 empresas.
Em entrevista coletiva de emergência o ministro Fernando Coelho Filho afirmou que a extinção da área de reserva amazônica, com área um pouco maior que a da Dinamarca, não terá impactos ambientais. Segundo Coelho Filho, o início das atividades de exploração na região ainda deve demorar 10 anos.
Coordenador da recém-criada Comissão de Mineração da Câmara de Comércio canadense, o empresário Paulo Misk participou dos seminários realizados em março no Canadá e não vê problemas na divulgação antecipada do fim da reserva.
“A gente tem que fazer um trabalho de divulgação, promoção e atração de investimento de mais médio ou longo prazo”, diz.
Misk também afirma que a ocupação da região por empresas de mineração deve inibir a presença de garimpeiros, cuja atuação irregular na região já resulta em contaminação de rios por mercúrio.
Presidente da ABPM (Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa Mineral), o geólogo Luiz Azevedo também esteve em Toronto e concorda. “Dizer que o governo está abrindo para o desmatamento é ridículo, é coisa de quem não conhece o assunto”, diz.
“Eu não me atrevo a falar sobre música. Fico impressionado como os artistas agora se atrevem a falar sobre mineração e sobre unidades de conservação”, diz, citando a modelo Gisele Bündchen, que criticou o anúncio em suas redes sociais.
Sobre o anúncio antecipado da extinção da área de preservação na Amazônia, Azevedo diz que o ministro divulgou que “uma área muito grande que seria liberada para pesquisa mineral”.
“O que eles querem são novas áreas para se pesquisar e novas possibilidades. Ninguém pode julgar o Canadá. Eles têm uma mentalidade mais cosmopolita, 70% da população é de imigrantes, então eles pensam nos outros. É um interesse legitimo”, avalia.
Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o geógrafo Luiz Jardim pesquisa a relação entre empresas de mineração canadenses e o governo brasileiro.
Ele explica que o evento em Toronto, quando o fim da Renca foi anunciado, era formado essencialmente por empresas menores especializadas em pesquisa mineral e investimentos de risco.
Jardim descorda da tese de que grandes mineradoras podem inibir o garimpo ilegal na região.
“A experiência no rio Tapajós, no Pará, mostra o contrário. O garimpeiro esta interessado em minas superficiais, a mineradora chega a veios mais profundos.”
Segundo o engenheiro Bruno Milanez, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora e membro do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração, que reúne 110 órgãos acadêmicos de pesquisa, sindicatos e movimentos sociais, não houve qualquer comunicado sobre a Renca para pesquisadores da área ou comunidades – diferente do que ocorreu com os empresários. “Acompanhamos pela imprensa”, diz.
Sobre esta aproximação entre governo e empresários, Milanez afirma que o movimento é “parte de um processo histórico, que vem se aprofundando” no governo Temer. (Folhapress)