Terça-feira, 08 de julho de 2025
Por Redação O Sul | 30 de agosto de 2020
O plano de reformulação de políticas sociais – que pretende substituir o Bolsa Família pelo Renda Brasil – colocou novamente o programa Farmácia Popular na mira dos cortes de orçamento dos técnicos do governo. O sistema foi responsável por atender 21,3 milhões de pessoas somente no ano passado, oferecendo medicamentos gratuitos ou com descontos de até 90% para a população.
No elenco, estão remédios de uso contínuo para tratamento de hipertensão arterial, diabetes, asma, dislipidemia, rinite, doença de Parkinson, osteoporose, glaucoma, incontinência urinária e anticoncepção. Um estudo elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) mostra que o Farmácia Popular diminuiu em 27,6% as internações e em 8% dos óbitos por hipertensão arterial e diabetes no SUS, entre 2003 e 2016. Apesar disso, o programa –, em vigor desde 2004, e com orçamento anual de R$ 2,5 bilhões – é considerado ineficiente pela equipe econômica por contemplar todas as pessoas, independentemente da renda mensal.
A avaliação diverge até do entendimento do Ministério da Saúde, que no Plano Nacional de Saúde considerou o Farmácia Popular como o mais bem-sucedido projeto de saúde pública do Brasil. Em todo o País, são mais de 28 mil farmácias cadastradas.
Sérgio Mena, presidente-executivo da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), lembra ainda a análise do economista Pedro Américo de Almeida Ferreira de que o Farmácia Popular salvou mais de 113 mil vidas e reduziu em quase R$ 150 milhões os gastos com internações, em 2016.
“Sua extinção seria lamentável e comprometeria a adesão ao tratamento com medicamentos, o que geraria um custo ainda maior. O programa corresponde a apenas 1,4% das nossas vendas, mas para a população carente, representa 100% de sua chance de tratamento. Para quem precisa dele, é a diferença entre viver e morrer”, avalia Sérgio Mena Barreto.
A presidente da ProGenéricos, Telma Salles, diz que o Farmácia é “essencial” para reduzir gastos da União com a saúde, pois controla especialmente doenças crônicas.
“É até cruel encerrar um programa que oferece remédios para doenças complexas. Elas foram escolhidas porque podem derivar complicações graves. Diabetes não tratada pode levar à cegueira ou à amputação. Extinguir um programa com essa capilaridade e com esse tipo de resultado é um erro”, afirma.
Em novembro de 2017, o governo já havia sinalizado a intenção de acabar com o programa, chegando a fechar 400 lojas da rede própria. No ano seguinte, cogitou reformular o modelo de pagamento para estabelecimentos particulares credenciados.
Para Chrystina Barros, pesquisadora do Centro de Estudos em Gestão de Serviços de Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a decisão de acabar com o Farmácia Popular refletiria em um maior custo para o estado a longo prazo, com o maior uso do SUS.
“É provável que as pessoas que controlam suas doenças com medicamentos vão deixar de fazer e, por consequência, terão mais derrames, enfartes e internações decorrentes de complicações de doenças crônicas, gastando mais ao invés de economizar”, opina.
Todo programa do governo demanda uma avaliação sobre sua efetividade, ou seja, se ele cumpre o que promete, alcançando resultados com eficiência e usando os recursos da melhor maneira possível. No caso do Farmácia Popular, a professora de economia do Ibmec-RJ Vívian Almeida explica que a equipe econômica teria justificado que pessoas que não têm baixa renda também estariam se beneficiando. Dessa forma, a intenção seria dar um valor maior, por meio do Renda Brasil, para que os beneficiários tenham a liberdade de escolher como usar esse dinheiro: com comida, medicamentos ou moradia.
A economista, no entanto, diz que também é preciso observar externalidades: “A ideia de fornecer medicamentos impacta uma melhora da saúde dos indivíduos, principalmente em um país que está empobrecendo. É claro que eficiência importa, mas é preciso observar outros fatores. Quais serão as necessidades e as prioridades dessa família? Vai sobrar dinheiro para medicamento?”, questiona
A médica Roberta França faz ponderação semelhante: “Nesse momento de pandemia, em que milhares de brasileiros que são arrimo de família perderam empregos, questiono como milhares de idosos vão conseguir comprar seus medicamentos.” As informações são do jornal Extra.