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Edson Bündchen Ativismo de sofá no divã

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A crescente dependência de novas tecnologias tem mudado nossas vidas, a forma como nos relacionamos, produzimos e vivemos em sociedade. O preço dessa dependência, em muitos casos, tem sido o sequestro do nosso tempo, horas de sono, a própria saúde, e influenciado diretamente o modo e a qualidade de tudo o que realizamos. Cada vez mais avançadas, as grandes empresas de mídia se valem de inteligência artificial para capturar a nossa atenção, fazendo com que a fidelização se dê à custa de maior dependência das programações, feitas sob medida para que o “ópio do século XXI” exerça todo o seu poder. Essa verdadeira rede neural cibernética, em suas infinitas interconexões, capturou e forjou alguns consensos naquilo que tem sido alcunhado de “globalismo”, uma espécie de agenda mundial de costumes e políticas, que seriam de aplicação sistêmica e abrangente. Ao se opor a essa diretriz planetária, muitos tem sido “cancelados”, excluídos da própria rede, tornando-se uma espécie de párias dentro do amplo espectro da internet. Esse fenômeno, em escala menor, também é observado em grupos de WhatsApp, Facebook, Twitter e tantos outros, onde pessoas usam o poder asséptico da distância digital para bloquear, excluir ou eliminar dos contatos todos aqueles que, de uma ou de outra forma, afrontam as suas convicções.

Essa onda de intolerância global, por certo, não foi criada pela comunicação em rede, mas evidentemente encontrou no frenesi e na instantaneidade das mensagens eletrônicas um meio de potencializá-la. Um dos estudiosos que melhor capturou esse ambiente de extrema volatilidade e fluidez das interações humanas foi o consagrado escritor polonês Zygmunt Bauman. Para Bauman, a modernidade líquida é infinitamente mais dinâmica do que a sociedade tradicional. O “ativismo de sofá” e o entorpecimento com o entretenimento barato são subprodutos das redes sociais, que hoje funcionam como uma espécie de arena pública, a exemplo de antigas praças, nas quais as pessoas se encontravam para conversar, com a diferença fundamental de se poder eliminar silenciosamente quem pensa diferente, à distância de um clique. Ao nos fechar nessas “zonas de conforto”, nas quais se ouve apenas o eco de nossas próprias vozes, caímos na armadilha de falsos consensos, uma vez forjados na ausência dos contrários, que promovem, de fato, a verdadeira dialética do saber em evolução. Essas relações menos duradouras, mais transitórias e instáveis, funcionam como uma área de escape para a solidão, porém ao preço de nos manter presos a algemas que colocam em risco o próprio sentido de individualidade, e de um saudável relacionamento social.

Há outros riscos também envolvidos nessa “alienação informada” que experimentamos. Em desabafo comovente, o jornalista e acadêmico uruguaio Leonardo Habekorn, desistiu de lecionar na Universidade de Montevidéu, alegando ser impossível “falar de assuntos que o apaixonam para alunos que não conseguem descolar a vista de um telefone que não cessa de receber selfies”. O WhatsApp e o Facebook venceram o inconsolável professor e nos dão a dimensão do atual desafio enfrentado por escolas no mundo todo. Vivemos num mar de informações, mas extremamente carentes de um saber não raso, aquele forjado no velho e bom hábito de leituras mais densas, para as quais se demandam tempo e muita dedicação.

Essa visão mais cinzenta das mídias sociais, entretanto, não é um veredito conclusivo sobre os limites e as potencialidades da comunicação via internet. Há amplas possibilidades para evitar as armadilhas existentes e construir espaços para diálogos, não somente produtivos, mas edificantes. Conjugada com uma nova postura, mais consciente dos riscos envolvidos no uso inadequado das mídias sociais, é possível evoluir. Estamos em pleno curso de um novo modo de convivência virtual, que não deve ficar refém de nenhum paradigma, que não seja o de maior autonomia do próprio indivíduo, e essa é uma decisão inalienável de cada um de nós.

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https://www.osul.com.br/ativismo-de-sofa-no-diva/ Ativismo de sofá no divã 2021-03-11
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