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Edson Bündchen Borboletas contingentes

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Tudo está em mutação, mas apenas o que permanece é – e o que permanece, senão a própria mudança?” Assim proclamando, o grego Heráclito inaugura a impermanência, num tempo tão antigo que uma frase da espécie poderia soar fora de contexto, na histórica Éfeso, onde nascera. Mas não mais. Depois dele, lentamente, ou em saltos, a humanidade passou a experimentar ciclos de mudança cada vez mais profundos, redundando numa interdependência tal que o bater de asas de uma borboleta em Berlim ocasione um tornado no Texas, conforme antecipava o professor Edward Lorenz, para uma atenta plateia, num encontro de cientistas, no já distante ano de 1969. A inauguração da “Teoria do Caos” coincide com a ascensão da visão sistêmica, na qual os elementos estão inextrincavelmente vinculados, influenciando de modo decisivo campos do conhecimento tão diferentes quanto a sociologia, a neurobiologia, a filosofia, as ciências sociais de forma geral, e até a arquitetura! Mais do que enxergar os fenômenos isoladamente, buscava-se uma forma de compreendê-los como fluxos em transformação, numa interação crescentemente dinâmica, e até certo ponto caótica.

A apropriação dos fundamentos da teoria dos sistemas não fica restrita, como se percebe, a uma determinada área, mas invade e influencia decisivamente o cotidiano de bilhões de pessoas, uma vez que a economia e a política também são afetadas diretamente por seus pressupostos. Assim, é lícito buscar entender alguns porquês e equívocos em abordagens de temas contemporâneos, criticamente vitais para o nosso futuro enquanto comunidade global, interagente, interligada e dependente, no sentido de uma articulação capaz de prover soluções efetivas através de suas políticas. Nessa perspectiva, a questão ambiental, o aumento da pobreza decorrente da atual pandemia, e a solidez das instituições, embora separadas conceitualmente, estão umbilicalmente ligadas quando consideradas a partir de suas inter-relações, no campo metafórico de um organismo vivo, integrado e complexo. A ausência desse nível de alcance, compromete não apenas o entendimento, mas uma interferência eficaz sobre os problemas a serem atacados.

Desse modo, a miopia dos governantes quanto às implicações sistêmicas de uma árvore sendo ilegalmente derrubada na Amazônia Legal, tem a mesma raiz daquele que não absorve a essência das interconexões provenientes da complexidade do “efeito borboleta”. Em outras palavras, essa mesma árvore ceifada e que hoje é ignorada, estará conectada a um contrato de exportação não concretizado no futuro, cujas motivações a montante talvez sejam impossíveis de precisar, sem recorrer a esse exercício de efeito causal regressivo. É também dessa forma quando se discutem os efeitos da Covid-19 sobre a pobreza, e não se encontram argumentos para justificar um inadiável apoio financeiro aos alijados do trabalho. Também aqui, a falta de visão do todo interdita uma decisão mais assertiva e tempestiva. A miopia sistêmica ainda se encontra e aflora toda a vez que ataques são feitos ao arcabouço institucional, seja a qualquer um dos poderes, particularmente e de modo insidioso quando as próprias prerrogativas democráticas, como a liberdade de expressão, são usadas para ferir a democracia, que em última instância lhe confere esse direito. São contradições todas nas quais carece o sistêmico e prevalece o ocluso, o isolado.

O conceito de aldeia global já não é novidade. O que chama a atenção é a incapacidade de muitos em assimilar aquilo que Heráclito, Lao Tsé e tantos outros já intuíam muito antes de Cristo, de que existe um fluxo eterno de mudanças, e que elas são interdependentes. Mais grave, perante essa realidade mutante, é que a aceleração provocada pelas modernas tecnologias tornou o custo dessa incompreensão mais trágico para a sociedade, impondo reposicionamentos urgentes dos modelos mentais, de forma que a impertinente borboleta a bater asas ao seu lado, não seja a causa de sua própria derrocada.

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