Quinta-feira, 17 de julho de 2025
Por Redação O Sul | 16 de março de 2020
Contrariando um entendimento manifestado em súmula do STJ (Superior Tribunal de Justiça), o TJ-RS (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul) concluiu que não configura estupro de vulnerável o relacionamento amoroso consentido entre um adulto e um menor de 14 anos. A decisão resultou na absolvição de um homem de 23 anos que manteve relações sexuais com uma adolescente de 13 anos.
Segundo a 6ª Câmara da Corte gaúcha, a relação foi aprovada pela família da menor e não houve qualquer indício de qualquer tipo de violência, grave ameaça ou dolo em forçar a prática dos atos sexuais. Uma decisão anterior do STJ, porém, considerou que o sexo ou ato libidinoso com menor de 14 anos representa estupro de vulnerável, independentemente de consentimento ou relacionamento amoroso.
O homem havia sido denunciado por manter conjunção carnal com menor de 14 anos de forma continuada (artigo 217-A, combinado ao artigo 71, ambos do Código de Processo Penal), com a incidência da Lei 8.072/90, que tipifica os crimes hediondos.
A Vara Judicial do município Espumoso (Região Norte do Estado) julgou a ação improcedente, por concluir que o fato denunciado não constitui infração à lei penal, como autoriza o artigo 386 do Código de Processo Penal. “Assim, por mais que o fato narrado na inicial fosse moralmente reprovável, a condenação do réu seria descabida ante as particularidades do caso concreto”, consta na decisão. “Ou seja, como não houve constrangimento, e sim consentimento, o fato é penalmente atípico.”
O juiz Daniel da Silva Luz observou que, apesar de o “constrangimento da vítima” não ser mais elemento essencial à caracterização da conduta típica de estupro, as circunstâncias do caso impedem uma análise apenas da legislação penal. Em sua percepção, os autos mostram que réu e vítima mantinham um relacionamento amoroso na época da denúncia, relação que era do conhecimento da família.
Dessa forma, ele ponderou ter ficado claro que a vítima consentiu com as relações sexuais, corroborando para essa tese o fato de que o homem e a adolescente atualmente moram com na casa dos pais dela: “Em síntese, ambos já vivem como marido e mulher”.
Apelação
Inconformado com a sentença, o MP (Ministério Público) apelou ao TJ-RS, pedindo a condenação do acusado nos moldes da denúncia. Sustentou que, no delito de estupro, sendo a vítima menor de 14 anos, há presunção absoluta da violência praticada. Assim, mesmo havendo o consentimento da vítima, está caracterizado o crime, como vêm decidindo os Tribunais Superiores.
A relatora da apelação-crime no TJ-RS, desembargadora Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, manteve a sentença, destacando a existência de ‘‘sentimentos sinceros de carinho e de zelo’’ entre réu e vítima deste processo. Além disso, observou, as provas sinalizam que a vítima tinha plena capacidade de entendimento da relação sexual, o que para a magistrada afasta a hipótese de vulnerabilidade da menor.
Ainda segundo a relatora, não se está diante de um caso de abuso, mas de “precocidade sexual”. Por esta perspectiva, prosseguiu, “seria hipocrisia condenar o réu num cenário em que a mídia — novelas, filmes, seriados e outros programas de televisão — estimulam, cada vez mais cedo, a sexualidade das meninas”.
‘‘Nesse passo, nos casos em que há um relacionamento amoroso e consentimento da menor nas práticas sexuais, resta relativizada a presunção de violência, em razão da idade da ofendida’’, finalizou a juíza, mantendo a sentença.
(Marcello Campos)