Terça-feira, 01 de julho de 2025
Por Redação O Sul | 10 de setembro de 2020
O suposto esquema de fraudes em operações de câmbio entre a Petrobras e o Banco Paulista, objeto da 74ª fase da Operação Lava-Jato aberta na manhã desta quinta-feira (10), tinha uma característica que foi considerada ‘curiosa’ pelo Ministério Público Federal no Paraná. Segundo a força-tarefa operação em Curitiba, agentes da mesa de câmbio do banco eram instruídos a incluir determinado sobrepreço nas operações celebradas com a estatal por meio de um código em que latas de cerveja equivaleriam ao montante da manipulação indevida.
O esquema foi detalhado aos procuradores pelo delator Paulo Barreto, ex-executivo do Banco Paulista. Segundo ele, no dia em que as operações seriam realizadas, um gerente da mesa de câmbio do Rio – onde as taxas de câmbio eram pactuadas diretamente com a Petrobrás –, ligava para os operadores em São Paulo e falava que tomaria ‘x’ latas de cerveja.
“Geralmente eram estabelecidas 8 latas de cerveja no sobrepreço. Cada lata de cerveja representava 0,001 na taxa de câmbio, de modo que 8 latas representaria acréscimo ou decréscimo 0,008, a depender se o contrato de câmbio seria de importação ou de exportação”, revelou o ex-executivo.
Segundo o procurador da República Antonio Diniz, o acréscimo ou decréscimo nas taxas de câmbio era quase imperceptível, mas em razão do volume bilionário negociado estima-se que o prejuízo à Petrobras pode chegar a cerca de R$ 100 milhões. “A própria variação cambial tratava de esconder as evidências de irregularidades, em sofisticado “modus operandi” que torna o crime quase perfeito. Muito dificilmente se conseguiria juntar as peças desse quebra-cabeça – cuja montagem ainda está em curso”, afirmou.
A Operação Sovrapprezzo visa justamente aprofundar as investigações sobre supostas fraudes em transações de compra e venda de dólares entre a Petrobrás e o Banco Paulista, que chegaram a R$ 7,7 bilhões. A Procuradoria destaca que tais operações, que se deram entre 2008 e 2011, foram operacionalizadas por apenas três funcionários da gerência de câmbio da instituição financeira.
Cerca de 100 agentes cumpriram 25 mandados de busca e apreensão nas cidades do Rio de Janeiro (16), Teresópolis (3) e São Paulo (6). Entre os alvos das buscas está a sede da Petrobras na capital fluminense. As ordens foram expedidas pela juíza Gabriela Hardt, substituta da 13ª Vara de Curitiba, que ainda determinou o bloqueio de ativos financeiros de 22 investigados, entre pessoas físicas e empresas, em contas no Brasil e no exterior, até o limite de R$ 97.965.000,00.
Segundo o Ministério Público Federal, entre os alvos dos mandados de busca e apreensão estão 3 executivos do Banco Paulista em São Paulo, outras 5 pessoas ligadas às empresas utilizadas no esquema no Rio de Janeiro, 3 funcionários que trabalharam à época na gerência de câmbio da Petrobras, além de 4 familiares desses últimos.
O procurador Alessandro Oliveira explica os detalhes da ofensiva, que é um desdobramento da 61ª etapa da Lava-Jato, a ‘Disfarces de Mamon’, e apura crimes de corrupção passiva e ativa, lavagem de dinheiro e associação ou organização criminosa.
Os procuradores da Lava-Jato em Curitiba apontam que para dissimular e distribuir os ganhos ilicitamente gerados nas operações de câmbio com a Petrobras, o Banco Paulista firmou contratos fraudulentos de consultoria com a empresa de fachada QMK Marketing e Qualidade, com o intuito de gerar recursos em espécie. “Do valor bruto das notas fiscais ideologicamente falsas, emitidas por serviços nunca prestados, revelou-se que o equivalente a 81% era devolvido ao escritório do Banco no Rio de Janeiro, através de empresa de transporte de valores”, apontou a força-tarefa em nota.
Durante as investigações ainda foram encontrados indícios de que, no período em que se deram os negócios com o Banco Paulista, os funcionários da Petrobrás e seus familiares tiveram variação patrimonial ‘positiva a descoberto e buscaram encobrir a riqueza auferida de maneira potencialmente ilícita com a utilização de mecanismos de lavagem de dinheiro’.
Entre as operações sob suspeita de lavagem, a Procuradoria cita: pagamento de imóveis com dinheiro vivo; compra de imóvel de alto padrão no Rio, reformado e explorado como pousada pelos investigados e seus familiares; a propriedade de direitos e ações em empresas offshore no Panamá, em nome das quais foram mantidos milhões de dólares em contas bancárias sediadas na Suíça, em Andorra, Liechtenstein e nos Estados Unidos.
O MPF registrou que há indicativos de que as operações de lavagem ocorreram até 2020.