Sexta-feira, 04 de outubro de 2024
Por Redação O Sul | 11 de agosto de 2024
Não há como não reconhecer que a Lei Maria da Penha, que completou 18 anos na quarta-feira, representa um avanço no combate à violência contra a mulher. Sancionada em 2006, ela foi batizada com o nome da farmacêutica cearense Maria da Penha Maia Fernandes, que se tornou paraplégica após ser baleada nas costas durante um assalto forjado pelo marido. Como se a violência fosse pouca, dias depois ele ainda tentou eletrocutá-la no banho. A demora para julgar o caso rendeu ao Brasil uma condenação na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA.
Em quase duas décadas, a Lei Maria da Penha permitiu que as vítimas tivessem instrumentos mais robustos para enfrentar seus agressores. Uma de suas consequências foi o aumento do número de medidas protetivas de urgência, que impõem restrições a potenciais agressores se aproximarem das vítimas.
Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, no ano passado a Justiça recebeu 663.704 pedidos de medidas protetivas, dos quais 540.255 (81%) foram concedidos. Em 2022, a Justiça havia recebido 547.201, dos quais 426.297 (78%) foram deferidos. Pela lei, a medida, que pode ser pedida em delegacias especializadas, centros de referência de violência contra a mulher, juizados de violência doméstica e ainda de forma on-line, precisa ser analisada em até 48 horas. O não cumprimento pode ser punido com prisão de seis meses a dois anos.
A promotora de Justiça Fabiana Dal’Mas, do Ministério Público de São Paulo, afirma que um dos maiores avanços da Lei Maria da Penha foi retirar o tema da violência contra a mulher da esfera privada para tratá-lo como um assunto de Estado. “O coração da Lei Maria da Penha é o aspecto preventivo. Você tem de falar em educação sexual, em educação de gênero. Quando o feminicídio acontece, é porque o Estado falhou na prevenção”.
Apesar do avanço, o Brasil ainda precisa fazer mais para conter a violência contra a mulher. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024 expôs o tamanho do desafio, uma vez que os números ainda são alarmantes — e muitos estão em curva ascendente. No ano passado, foram registrados no país 1.467 feminicídios (um aumento de 0,8% em relação ao ano anterior). Significa que quatro mulheres são assassinadas por dia no Brasil. As tentativas de feminicídio também impressionam, com 2.797 ocorrências, quase oito por dia. O número representa aumento de 7,1% em relação ao ano anterior.
Após 18 anos da promulgação da lei, é preciso que a sociedade se pergunte por que, apesar de uma legislação avançada, os casos de violência não arrefecem. A própria vítima que inspirou a lei hoje precisa de proteção policial devido às ameaças de morte disparadas nas redes sociais. “Se a violência contra a mulher é um fenômeno social, que impacta milhares de meninas e mulheres em nosso país, não há mais como conceber qualquer tipo de alienação masculina”, diz a promotora de Justiça Silvia Chakian, do Ministério Público de São Paulo. “Exige-se que aquele que é parte do problema também seja parte da solução.” (Opinião/O Globo)