Sábado, 12 de julho de 2025
Por Redação O Sul | 8 de março de 2020
A alta acumulada de 15,6% no dólar em relação ao real, desde o início de janeiro, normalmente poderia ser encarada como um sinal positivo para a atração de investimentos, pois deixa os ativos brasileiros mais baratos para os estrangeiros. Mas essa vantagem não traz necessariamente os resultados esperados no atual momento de turbulências, em meio à epidemia mundial de coronavírus e outros fatores.
O executivo Thiago Xavier, da empresa de consultoria Tendências, explica que a desvalorização do real ocorreu de forma simultânea à de outras moedas, o que iguala o País aos concorrentes: “É preciso ver se houve alteração do câmbio na relação com as moedas de países com os quais o Brasil quer se relacionar. Se for um movimento global, pode ser que não tenha gerado ganho para o Brasil”.
Mudanças bruscas do câmbio deixam os agentes sem saber qual será o valor para fechar o negócio. Um investidor pode ficar receoso de aplicar um recurso aqui e, depois, o dólar se desvalorizar. “As empresas costumam fazer ‘hedge’ [seguro contra alta ou baixa do dólar] para se proteger”, acrescenta Xavier. “Mas em momentos de alta volatilidade esse seguro fica mais caro.”
De acordo com Rafael Cagnin, do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), o Brasil ainda depende de insumos de fora, e a alta do dólar dificulta a vida das empresas. Seria um fator positivo para as exportações, mas não neste momento, ressalva:
“Esse fator positivo é anulado, com a economia internacional com risco de ter queda no primeiro trimestre. Além do impacto sobre a estrutura patrimonial das empresas que têm dívidas em moeda estrangeira, diminuindo a capacidade de tomar novos créditos. Esse impacto é rápido e direto”.
Evasão
Para o empresário Mark Essle, sócio da consultoria norte-americana A. T. Kearney, os efeitos da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, mais as incertezas com o coronavírus e conflitos políticos, continuarão a frear investimentos no Brasil:
“Isso afeta a Bolsa, e já houve uma saída brutal de investidores, o que pressiona o dólar, incentivando uma fuga em direção a ativos de maior qualidade e menor risco. Antes, as empresas usavam a taxa de juro do Brasil para ganhar. Havia um risco cambial, mas valia a pena. A apreciação da moeda americana foi matando o apetite por investimento em ativos do mercado brasileiro”.
Apenas neste ano (que ainda não fechou um trimestre), investidores estrangeiros retiraram R$ 44,8 bilhões da Bolsa de Valores brasileira, montante que já supera o registrado ao longo de 2019. O economista Cláudio Frischtak, da consultoria Inter.B, chama a atenção para a turbulência deste ano na economia brasileira:
“Se o pico da epidemia for mesmo em abril ou maio, como preveem alguns especialistas, metade do ano já se foi. Mesmo com reação forte no segundo semestre, fica difícil. Se a economia global crescer perto de 1%, será a repetição de 2008/2009, quando houve a grande recessão”.
O FMI (Fundo Monetário Internacional) previa uma expansão de 3,3% para a economia global em 2020. Após a epidemia do coronavírus, a estimativa atualizada é de que esse avanço será menor que os 2,9% do ano passado.
Luís Afonso Lima, da consultoria Sobeet, menciona outro fator que não pode ser desprezado: os investidores estrangeiros ficam mais retraídos em momentos como este, por problemas em suas matrizes. Como as operações estão sendo reduzidas na Europa, onde o efeito da epidemia é mais sentido, e na Ásia, as empresas vão repensar seus planos de investimento no exterior, diz Lima.
Para o presidente na América Latina da empresa Whirlpool (maior fabricante de eletrodomésticos do País e dona das marcas Brastemp e Consul), João Carlos Brega, é preciso avançar na reforma tributária, de forma a simplificar a vida das empresas, evitando a judicialização e a sonegação:
“Depois dos Estados Unidos, o Brasil é o país com mais de 100 milhões de habitantes que apresenta maior potencial de crescimento a curto prazo. As reformas trabalhista e da Previdência foram importantes, mas o País precisa de uma reforma tributária que alinhe os interesses dos diferentes segmentos da economia. O governo já está reduzindo o tamanho do Estado na economia. O investimento privado cresceu mas é preciso que os estrangeiros tenha segurança para aplicar a longo prazo.