Terça-feira, 01 de julho de 2025
Por Lenio Streck | 20 de junho de 2020
Há muito tempo que eu não trabalhava tanto. Já não tenho sossego. Todos os dias, menos domingo, tem alguma laive ou webinar para fazer. É bom, mas também cansa, principalmente se o outro lado às vezes não ajuda. Dica: se quer fazer uma laive, prepare um roteiro. Previamente. O entrevistado quer ser interrompido. Por nova pergunta sua. E se o entrevistado contar uma anedota, ria. Não faça cara de paisagem.
Fato: É difícil dizer não, porque quem convida sabe que estou em casa. Logo…
O colunista da Folha de São Paulo, Antonio Prata, escreveu belo texto sobre a “era zoom”. Diz ele que uma reunião por computador é paradoxalmente mais distante e mais próxima do que um encontro presencial. Mais distante por razões óbvias: as pessoas estão reduzidas a duas dimensões, presas em quadradinhos numa tela. Por outro lado, somos brindados com uma pequena moldura de intimidade alheia que não seria revelada em torno da mesa de um escritório.
Vemos a sala ou o quarto dos outros. A estante de livros. Vejo uma boina pendurada no cabide de um colega de trabalho que eu julgava discreto e austero. Em que ocasião ele usa essa boina? Será que meu colega não é careta e austero coisa nenhuma e aos domingos veste a boina, acende um cachimbo e pinta telas com nus gigantes?
Além da moldura domiciliar, conta-nos Prata, há mais intimidade no Zoom pela liberdade de olharmos para onde quisermos. Numa conversa presencial, devemos manter os olhos colados nos olhos de quem fala. Numa reunião via Zoom com 30 pessoas a gente pode escolher qualquer dos quadradinhos e ficar ali examinando o infeliz, reparando em suas orelhas, seus óculos, suas expressões. (Faça isso presencialmente e você vai soar como tarado ou serial killer. Ou serial killer tarado.)
E complementa: Numa reunião online cada um tem uma qualidade de conexão diferente e as reações chegam embaralhadas, às vezes com vários segundos de atraso. Ficamos sem um feedback confiável sobre como estão recebendo nossas informações.
É por isso, aliás, que a gente se atropela tanto numa reunião online. Ao vivo, sabemos interpretar perfeitamente o fluxo da conversa. Lemos no outro a antecipação de uma pausa, num outro a intenção de uma fala, num outro, ainda, a disposição para a briga. Uma conversa de várias pessoas é uma sinfonia emocional cuja partitura a seleção natural nos moldou, por milhares de anos, para ler. Na reunião online, cada um segue um metrônomo diferente, conclui Prata.
É isso. Sem tirar, nem por. E o pior é que, na webinar, geralmente você fica olhando para você mesmo. Chato. Muito chato olhar para si mesmo durante 40 minutos, sem um piscar de olhos do outro lado. Você conta uma anedota e ninguém ri. Bah.
Essa pós-modernidade não me agrada. Mas é o que se tem no momento. Mas é bom não nos acostumarmos. Uma coisa é eu fazer 20 palestras-conferencias por ano – presenciais. Outra coisa é fazer 25 por mês.
Outro dia inventei uma piada. Sim, você pode rir. De tantas laives que existem, principalmente na área do Direito, falta gente para assistir as laives… porque todos estão fazendo… laives.
É isso. Fui. Porque a esta hora, 13h11 minutos de sexta-feira em que escrevo esta coluna, ainda tenho uma webinar as 15h e uma laive as 17h.