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Edson Bündchen Predadores da esperança

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A construção da reputação é um processo longo, que exige esforço, firmeza de propósito, e um caráter inabalável. Isso é válido tanto para nações, organizações ou indivíduos. Esse conjunto de virtudes, contudo, também pode ser destruído, caso vacilem os ânimos, fraqueje a determinação, e não sejam respeitados os valores e princípios que compuseram o seu propósito original. O Brasil, nessa perspectiva, deu um gigantesco passo atrás com o fim da operação Lava Jato, não pelo encerramento da operação em si, uma vez que um dia ela haveria de terminar, mas pela forma terrivelmente premonitória como tudo aconteceu, de maneira que o enredo a que estávamos condenados fosse a clássica crônica de uma tragédia anunciada. Milhões acreditaram que todo o trabalho da Lava Jato nos deixaria um importante legado, seja de costumes, seja cristalizado na própria Lei. Mas não! Dolorosamente, assistimos ao retorno da sensação de impunidade, de tão triste memória para todos aqueles que ousaram sonhar com um País mais justo e digno.

O inédito e gigantesco esforço dos integrantes da maior operação anticrime que o nosso País já teve, enfrentou, durante mais de seis anos, com destemor e competência, a missão de desconstruir a crença de que a prisão, no Brasil, não foi feita para abrigar crimes do “colarinho branco”. Gradualmente, entretanto, os rumores de que havia algo fora do lugar, e que ameaça ao “status quo” ganhava corpo, os porões do “mecanismo”, tão bem descrito pelo cineasta José Padilha, começavam a se movimentar. Nesse tenebroso processo, a abertura das comportas para o esfacelamento da Lava Jato contou com colaboração de muitos. Era urgente, para os criminosos, recompor o sistema defensivo para proteger o “sindicato dos ladrões”, pegos de surpresa pela eficiência dos agentes da Justiça brasileira. Não tardou para que ataques em série, muitos amparados em filigranas jurídicas, e outros bem mais ostensivos e desavergonhados, passassem a minar e a desacreditar os avanços da operação. No momento em que o ímpeto das ruas cessou, a correlação de forças também mudou. O “antilavajatismo” se consolidou, pressagiando uma situação de fábula, na qual o lobo comeria o cordeiro, inapelavelmente!

Para os detratores da operação, não foi apenas suficiente acabar com a Lava Jato, mas dar-lhe ares de indignidade, justo ela que nos deu tanta esperança. Esse verdadeiro e implacável fogo cruzado que a força-tarefa enfrentou não pode ser ignorado, sem que, pelo menos, extraiam-se lições e aprendizados para o futuro. Mesmo diante dos saudosistas da impunidade que hoje se rejubilam e festejam o crepúsculo da Lava Jato e a volta do “velho e previsível Brasil”, é possível e necessário avançar. A sobrevivência, todavia, do espírito que alçou a Lava Jato à condição de patrimônio nacional, é uma missão cooperativa, de todos os que ainda alimentam a expectativa de um amanhã melhor. Ele estará tão vivo quanto viva seja a nossa capacidade de não perdermos o direito à indignação, transformada em permanente e ativa vigilância.

Nessa perspectiva, é necessário compreender que uma nação vai além de um território comum, de uma mesma língua… Seu caráter se constrói com a força dos símbolos, em histórias que envolvam honra, coragem, bravura. Uma nação também se edifica e se fortalece quando existe uma crença compartilhada de que vale a pena ser honesto, respeitar os costumes, e defender uma ética na qual prevaleça a boa vontade entre as pessoas. Quando esses pilares são solapados, quando esse pacto tácito é quebrado, vence a ética dos interesses, sacrifica-se a ética da convicção, e a desconfiança passa a nutrir uma sociedade cínica, na qual prosperam projetos individualistas de curto prazo, em tenebrosos conluios. Em contraste, apostar no futuro significa fortalecer os laços de confiança, pois uma comunidade que não comunga valores de longo prazo, acaba por sacrificar seus próprios filhos, vítimas daqueles que assassinam a esperança à queima-roupa.

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https://www.osul.com.br/predadores-da-esperanca/ Predadores da esperança 2021-02-11
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