Segunda-feira, 05 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 5 de maio de 2025
Um bufê que recebeu dinheiro de um sindicato investigado na fraude do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) fica em um endereço em Brasília (DF) com as portas fechadas e tem apenas um cartaz com o nome e o telefone colado do lado de fora. A Polícia Federal suspeita que essa e outras empresas tenham recebido valores desviados da folha de pagamento de aposentados.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) é uma das entidades investigadas por descontos indevidos em aposentadorias e pensões do INSS. Em nota, a entidade negou que tenha cometido alguma irregularidade. A defesa do bufê não respondeu.
O esquema levou à queda do ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, e do presidente do instituto, Alessandro Stefanutto, além do afastamento de outros dirigentes. Há suspeitas de lavagem de dinheiro e recebimento de propina por parte de servidores do órgão.
Relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificou a saída de R$ 26,5 milhões da Contag para 15 contas de outros sindicatos, empresas e pessoas físicas de forma fracionada.
Desse valor, R$ 737,9 mil foram para a “Tuttano Culinária Artesanal LTDA”, uma empresa aberta em 2021 que declara oferecer serviço de alimentação e bufê na capital federal. Chamou a atenção da PF o fato de a firma ter sido fundada na época em que a Contag começou a aumentar o faturamento com os descontos do INSS.
A sede do bufê fica no Núcleo Bandeirante, uma região administrativa do Distrito Federal, a cinco quilômetros da sede da Contag. Na tarde da última quarta-feira, 30, o local estava fechado, com a porta metálica cerrada. Na porta, um papel com o nome da empresa e o telefone estava fixado.
A reportagem do jornal O Estado de S. Paulo informou ter telefonado para o número informado, mas os responsáveis não quiseram dar entrevista e passaram o contato de um advogado. A defesa, no entanto, não retornou aos pedidos da reportagem. Pessoas ao redor relataram, segundo o jornal, que não há atendimento nem movimento intenso, mas apenas entradas e saídas de pessoas para pegar equipamentos e materiais de trabalho.
O dono do bufê é André Guimarães, segundo o relatório da PF. A Tuttano foi aberta no nome do filho dele. André tem outro CNPJ de alimentação e eventos na loja ao lado, a “Inovah Locação de Materiais, Buffet e Organizações de Eventos Eireli”, que também estava fechada e com o número de telefone colado na porta. Os contatos de celular e e-mail são idênticos.
As duas empresas usam o mesmo nome fantasia: André Gourmet Buffet. Nas redes sociais, há fotos de eventos e a última publicação é de janeiro de 2024. Uma firma foi inaugurada em 2013. A outra, que recebeu dinheiro da Contag, foi aberta em 2021, e a Polícia Federal suspeita que essa tenha sido usada para movimentar dinheiro desviado da associação.
Durante a busca e apreensão, a PF constatou que não havia sinal de funcionamento do bufê no local. Segundo a investigação, o valor recebido pela empresa se fracionou e foi transferido para outros 10 beneficiários, incluindo R$ 840 mil para um professor da rede pública do Distrito Federal e R$ 172 mil para uma pessoa que tem um salário de R$ 1,7 mil mensal, ou seja, uma renda incompatível com a quantia recebida. Outro fato foi alertado: a Tuttano não só recebeu dinheiro da Contag como transferiu R$ 453 mil para o mesmo sindicato.
Para os investigadores, os valores transferidos pela Contag para o bufê em Brasília e outras empresas entre 2021 e 2024 não têm justificativa aparente e indicam um possível desvio dos valores das mensalidades descontadas dos aposentados.
Além disso, o Coaf alertou a PF que o dinheiro movimentado na conta do bufê são incompatíveis com o faturamento da empresa. Saques em dinheiro dificultaram a identificação do destino dos pagamentos e também foram registrados.
“Segundo os dados informados pelas instituições financeiras ao Coaf, a empresa possui faturamento declarado de R$ 101.638,13, mas movimentou cifras milionárias (mais de R$ 2 milhões) nos meses 08/2023 e 09/2023, em evidente descompasso”, diz relatório da PF.
Entre 2019 e 2024, a Contag arrecadou R$ 2 bilhões com a cobrança de mensalidades de 1,3 milhão de aposentados e pensionistas descontadas diretamente da folha de pagamento dos beneficiários, segundo as investigações. Uma análise feita pela Controladoria-Geral da União (CGU) mostrou que a maior parte das cobranças não foi autorizada pelas pessoas.
A Polícia Federal e o Ministério Público Federal suspeitam que o sindicato de Brasília foi beneficiado com descontos indevidos de milhares de aposentados e pensionistas do INSS e que a ação pode ter ocasionado enriquecimento ilícito dos envolvidos.
Em nota, a Contag negou que tenha praticado qualquer tipo de irregularidade no desconto dos aposentados e pensionistas. A confederação também afirma que alertou o INSS sobre problemas nos descontos.
“A Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag) vem a público informar que não praticou nenhuma irregularidade em relação ao processamento de descontos de mensalidades associativas nos benefícios previdenciários concedidos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Inclusive, a Contag denunciou ao INSS, por duas vezes, descontos indevidos e práticas abusivas contra aposentados e pensionistas rurais”, diz o texto. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.