Segunda-feira, 18 de agosto de 2025
Por Redação O Sul | 18 de agosto de 2025
O juiz Thiago Notari Bertoncello, da 7ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, atendeu parcialmente a pedidos da Defensoria Pública do Estado (DPE) em ação civil pública movida contra a prefeitura, a Pousada Garoa e seu proprietário. Em abril do ano passado, um incêndio na unidade da empresa na avenida Farrapos deixou 11 mortos e 15 feridos.
Na decisão – em caráter liminar (provisório) – o magistrado concordou que as medidas adotadas até agora pelo poder público municipal têm sido insuficientes para garantir às vítimas, especialmente àquelas em situação de rua, condições adequadas para superar os danos sofridos e evitar o retorno à situação de desamparo social ou de saúde.
Ele sublinhou que, via de regra, não cabe ao Judiciário impor diretamente a adoção de políticas públicas, mas determinar que o Executivo apresente planos e meios para alcançar os resultados necessários à proteção de direitos fundamentais. Diante da gravidade do caso, entendeu ser legítima a intervenção do Judiciário.
A decisão prevê que a prefeitura uma série de determinações. Confira, a seguir:
– Apresentar, em até 20 dias úteis, de uma plano individualizado para disponibilizar moradia digna e segura (não provisória ou em albergues) a todas as vítimas sobreviventes do incêndio até agora identificadas, bem como para atendimento a todos os sobreviventes, com detalhamento sobre a atual situação de moradia, saúde física e mental, além de medidas de reintegração social.
– Avaliar se o programa “Moradia Cidadã” (objeto da Portaria nº 453/2024 do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania) é viável sua implementação, mediante prestação de informações nos autos do processo, sobre os motivos para a decisão, também no prazo de 20 dias úteis. Se o resultado da avaliação for a adesão ao programa, deverão ser adotadas as providências e medidas necessárias à sua implementação com a devida prestação de contas sobre cada etapa concluídam, de acordo com a cartilha disponível no site do governo federal.
– Providenciar, em até 15 dias úteis, o acesso a atendimento psicológico e psiquiátrico especializado, com agendamento prioritário, para todas as vítimas identificadas que assim desejarem, além de acompanhamento psicossocial continuado por equipe multiprofissional da rede de proteção social.
– Encaminhar relatórios mensais sobre evolução das medidas efetivadas, com identificação nominal das vítimas e descrição dos atendimentos realizados, sempre até o dia 5 (ou no dia útil seguinte, caso a data-base caia em fim de semana ou feriado.
Indenizações
A Defensoria Pública do Estado pede indenizações coletivas e individuais para as vítimas ou seus familiares. Também reivindica que os réus sejam condenados a pagae R$ 10,1 milhões ao Fundo Estadual de Defesa do Consumidor (Fecon), bem como indenização individualizada aos familiares dos mortos, em valor não inferior a 400 salários-mínimos por óbito, e para os sobreviventes por danos psicológicos (em valor não inferior a R$ 50 mil por pessoa), além de indenização por danos existenciais (também em valor não inferior a R$ 50 mil por pessoa).
Conforme o juiz, a decisão tem por finalidade principal garantir o atendimento adequado aos atingidos pela tragédia, em especial àqueles que que se encontravam em situação de rua quando recorreram ao serviço de hospedagem da unidade incendiada.
Ele também reconheceu indícios de responsabilidade solidária dos réus (prefeitura e empresa de hospedagem), principalmente por omissão no dever de fiscalização das condições de segurança e salubridade do local, que era credenciado pelo poder público para acolher indivíduos sob vulnerabilidade social.
Por fim, admitiu o processamento do pedido para que o patrimônio do sócio da Pousada Garoa possa ser atingido, caso fique comprovado que a empresa não tem condições de arcar com as indenizações.
Já en relação aos pedidos de indenização, o magistrado observou que os valores pretendidos pela DPE são elevados e que a empresa responsável pela pousada, por ser enquadrada como microempresa, não teria condições financeiras de bancá-los. Ele também apontou indícios de prática de ato culposo grave por parte do sócio-administrador da pousada, conforme relatório acostado pela Polícia Civil e demais elementos probatórios.
CPI na Câmara
No dia 26 de junho, por sete votos a quatro, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara de Vereadores de Porto Alegre sobre o incêndio aprovou relatório final que isenta a prefeitura de culpa no incidente, ocorrido em maio do ano passado. A maioria do colegiado considerou que a responsabilidade civil e criminal é do proprietário do estabelecimento, por “omissão grave”.
O texto final é de Marcos Felipi (Cidadania). Além deram, disseram “Sim” os colegas Rafael Fleck (MDB), Coronel Ustra (PL), Mauro Pinheiro (PP), Hamilton Sossmeier (Podemos), Gilvani o Gringo (Republicanos), e Ramiro Rosário (Novo). Já o “Não” foi registrado por Alexandre Bublitz (PT), Erick Dênil (PCdoB), Giovani Culau e Coletivo (PCdoB) e Pedro Ruas (Psol), presidente da CPI.
Relembre o caso
No dia 23 de abril de 2024, o fogo atingiu uma unidade da Pousada Garoa localizada em trecho da avenida Farrapos entre as ruas Barros Cassal e Garibaldi, região central da cidade. Além dos 11 mortos, outras 15 pessoas ficaram feridas. Na madrugada da tragédia, o estabelecimento abrigava 32 ocupantes, todos em situação de vulnerabilidade e que pernoitavam no local por meio do chamado “aluguel social” bancado pela Fasc.
Trata-se do pior incidente do tipo na capital gaúcha desde abril de 1976, quando a célebre tragédia da loja Renner no Centro Histórico custou 41 vidas. Em novembro de 2022, outra filial da rede – na rua Jerônimo Coelho entre Marechal Floriano e Vigário José Inácio (Centro Histórico) – havia sofrido incêndio semelhante, com um morto e 11 feridos.
(Marcello Campos)