Segunda-feira, 14 de julho de 2025
Por Redação O Sul | 25 de fevereiro de 2024
Homenagens a outros parentes, o santo do dia, o nome da moda e os de celebridades pesam na hora de registrar um recém-nascido. Mas o poder dos pais tem limites, neste caso. A escolha que a criança irá carregar pelo menos até a maioridade tem de levar em consideração a legislação que determina que os oficiais de cartório devem vetar nomenclaturas que possam gerar futuros constrangimentos. Mas há pais que não se deixam deter e recorrem à Justiça para fazer valer a sua originalidade.
Foi a opção do porteiro Alex Lauriano de Lima, de 38 anos, pai de Jonathan Calleri Marchi de Lima, de 8 meses. A criança é homônima do centroavante do São Paulo. Morador de Jaboticabal, no interior paulista, Lauriano não se conformou com a negativa do cartório da cidade ao tentar homenagear o ídolo, e, após o nascimento do primogênito, recorreu às barras do tribunal.
A inspiração para batizar o pequeno Calleri veio após a campanha do São Paulo na Libertadores de 2016, ano em que o jogador argentino foi artilheiro da competição. A escolha foi feita até mesmo antes de Alex conhecer a mulher e mãe do bebê.
“Fiz a promessa de que esse seria o nome no jogo em que o argentino marcou dois gols (contra o River Plate). Quando conheci minha esposa, falei que, se tivesse um filho, teria que ser esse o nome, e ela topou na hora. O dia em que fui ao cartório e não aceitaram foi frustrante, chorei muito. Mas não desisti, porque já tinha até o quartinho dele personalizado”, lembra.
O advogado que atuou no caso, José Geraldo Soares, lembra que a alegação do cartório de Jaboticabal era de que Calleri era um sobrenome não transmitido pelos pais. A escolha, assim, ligaria o rebento a uma outra família.
“Alegamos que era uma nome estrangeiro, já que o jogador era argentino, o que tornaria a junção com Jonathan um nome composto, assim como John Lennon e Michael Jackson, que são constantemente registrados”, explicou.
Quem também precisou brigar pelo direito de batizar o filho com o nome que queria foi Seu Jorge. Em janeiro de 2023, o cantor foi impedido de registrar o filho caçula como Samba em uma primeira tentativa no Cartório de Registro Civil do 28º Subdistrito de São Paulo. A autorização só foi concedida após o artista enviar um documento explicando que a palavra foi escolhida por se conectar tanto com a música brasileira quanto com a sua ascendência africana.
As negativas dos cartórios são amparadas na Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973, que afirma que “o oficial de registro civil não registrará prenomes suscetíveis de expor ao ridículo os portadores”. Não há, no entanto, definições de critérios para essa avaliação, deixando quem atende os pais fazer a análise. A diretora da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo (Arpen-SP), Daniela Mroz, explica que a decisão depende do bom senso.
“Eu mesma não aceitei registrar um bebê com o nome de Corintiano, e o juiz concordou comigo. Não é só a vontade dos pais. É o futuro da criança que está em jogo”, ressalta Mroz, que defende a criação de parâmetros para definir quais nomes podem ser usados.
As polêmicas em torno de nomes excêntricos fazem sucesso na internet e são exploradas pelo influenciador Alex Rodrigues Moreira, de 30 anos. No perfil “O cara do cartório”, ele conta casos de seus 16 anos no ramo, relatando passagens como o dia em que negou o registro de um Ahriel, por conta da grafia.
“Em um dos vídeos falo sobre não se poder registrar crianças com nomes de pessoas que tenham uma má impressão na sociedade, como Bin Laden, Hitler e Lúcifer”, destaca.
O advogado civil Daniel Navarro Puerari explica que legalmente não existe uma lista de nomes proibidos no Brasil, mas que há uma jurisprudência de não aceitar registros de homônimos de autores de crimes contra a humanidade.
“Nomes que remontam a agressões muito graves não podem ser escolhidos como prenome porque podem criar um estigma. A nomenclatura exporia a criança ao ridículo, e ela ficaria suscetível a traumas emocionais, principalmente em uma sociedade onde o bullying é tão recorrente”, avalia Puerari.