Quarta-feira, 07 de maio de 2025
Por Redação O Sul | 6 de maio de 2025
Mulher negra em primeiro mandato como deputada federal, enfermeira Rejane (PCdoB-RJ) tem enfrentado um desafio que não esperava na Câmara dos Deputados: ter sua posição invisibilizada.
Na noite de segunda-feira (5), ela fez um desabafo no plenário da Casa. “Eu queria deixar registrado o assédio que estou sofrendo em todos os momentos que adentro tanto o prédio do Congresso quanto o plenário”, disse no microfone.
“Todas as vezes que entro sou barrada, e me perguntam se sou ou não deputada. E estou sempre usando o meu brochinho”, disse ela, em referência ao broche que identifica os deputados e deputadas e deve ser usado como forma de identificação.
Atualmente, 22 mulheres exercem o cargo de deputada federal, do total de 513 deputados. Ou seja, menos de 5% da composição da Câmara.
Nas últimas eleições para o cargo, em 2022, foram eleitos 107 parlamentares que se declaram pardos e 27 pretos, ante 370 brancos. Outros são 5 indígenas e um amarelo. Um deputado preferiu não declarar sua raça.
Rejane assumiu o mandato em fevereiro deste ano, após o titular do cargo, Washington Quaquá (PT-RJ), ter sido eleito prefeito de Maricá (RJ).
Desde então, ela afirma que já foi tratada de forma hostil em diversas ocasiões na Câmara: ao ser barrada na entrada exclusiva para os deputados (que não demandam revista pelo raio-x), nos elevadores, na entrada de comissões e até na entrada do plenário da Casa.
Em entrevista ao portal de notícias G1, Rejane disse ter chorado durante toda a noite depois do desabafo — e, mesmo durante a conversa com a reportagem, voltou a se emocionar em diversos momentos.
Segundo ela, o estopim para seu desabafo foi ser barrada no plenário durante a sessão deliberativa noturna. “Quando eu já tinha entrado no plenário, já tinha passado pela segurança de fora… Como lá dentro o cara vai me barrar? Ele disse: ‘não pode entrar aqui não, não pode entrar aqui não’.”
“Eu reagi até com um palavrão. Falei: ‘Não está vendo que eu sou deputada?’ e aí ele me deixou sentar”, disse.
Falta de apoio
Segundo Rejane, o que aumentou sua mágoa foi não ter recebido acolhimento dos pares. Ela acredita que muitos podem não ter tomado conhecimento do episódio, mas recebeu apoios tímidos dos colegas, o que não evitou sua sensação de desamparo.
A declaração de uma colega, a deputada Laura Carneiro (PSD-RJ), ampliou esse sentimento. A parlamentar minimizou as críticas de Rejane.
“As pessoas não são obrigadas a conhecer todos. Nós somos 513 Deputados. E também há mudanças, porque entram os suplentes, vêm novos Deputados”, disse.
Enfrentar o racismo não é novidade na vida da parlamentar. Ela disse que, durante seus mandatos como deputada estadual pelo Rio de Janeiro, entre 2010 e 2022, sofreu racismo dos colegas deputados.
Mas, afirmou não lembrar de ter o cargo questionado por funcionários da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).
Para Rejane, um dos episódios mais marcantes ficou guardado não pelo ressentimento, mas pelo apoio que recebeu de três deputadas negras após ter sido alvo de racismo.
“Elas falaram no meu ouvido: ‘Negona, tu não está mais aqui sozinha, nós estamos junto com você’”.
A sensação, a cada vez que é confundida com alguém sem cargo, segundo ela, é de constrangimento.
“Essa é uma cultura que deve acabar”, disse. Diante do incômodo, a deputada cobra um melhor treinamento dos funcionários da Câmara, além de campanhas de conscientização.
A expectativa para o futuro é seguir em busca de mais direitos para negros, LGBTs, mulheres e profissionais da enfermagem, sua categoria.
“Eu sou uma pessoa que preciso chorar. Se eu não desabafar… Sempre fui assim. Mas daqui a pouco isso vai passar, não vai me afetar não. Mas não vai mesmo.”