Quarta-feira, 16 de julho de 2025
Por Redação O Sul | 24 de junho de 2020
Em meados de março – quando a pandemia começava a dominar o mundo – Francesco Calvaruso viu uma caixa da Universidade de Oxford no laboratório onde trabalha ao sul de Roma. Dentro dela, embalados com gelo seco, havia vários pequenos frascos. Cada um deles continha algumas gotas de amostras, um kit inicial para a produção de uma potencial vacina para a Covid-19.
O trabalho de sua empresa era transformar algumas gotículas em uma quantidade grande o bastante para 13 mil pessoas – uma quantidade suficiente para realizar ensaios em larga escala que são desenvolvidos agora em vários continentes.
“Nós podíamos realmente sentir a pressão”, disse Calvaruso, gerente de produção da Advent, que precisou de dois meses para crescer, filtrar e purificar uma vacina experimental conhecida como AZD1222.
Essa vacina, como todas as demais projetadas para combater a pandemia, permanece não comprovada. Mas está mais à frente no processo experimental do que os outras, e se transformou na melhor – e talvez única – chance do Ocidente de ter uma vacina viável antes do final do ano.
Oxford fabricou sua própria vacina para uso no primeiro e pequeno teste, conhecido como Fase I. Mas, para os testes maiores atualmente em andamento – envolvendo dezenas de milhares de pessoas –, recorreu à Advent, uma divisão do grupo IRBM, que há uma década tem se concentrado em fazer um tipo específico de vacinas experimentais, usando adenovírus.
A ideia de ter uma vacina tão rapidamente – quando o processo de experimentação e aprovação normalmente leva uma década – pode ter parecido utópica no início do surto.
Mas, dada a escala da pandemia e a velocidade com que os cientistas estão avançando, os países europeus estão fazendo fila atrás do projeto da Universidade de Oxford, dizendo que os primeiros sinais dão motivos para otimismo.
Na semana passada, Itália, Alemanha, França e Holanda fecharam um acordo para 400 milhões de doses da vacina experimental de Oxford, que, se aprovada pelos órgãos reguladores, seria produzida pela farmacêutica anglo-sueca AstraZeneca. Essa empresa também chegou a acordos semelhantes com a Grã-Bretanha e os Estados Unidos, onde o governo Trump forneceu US$ 1,2 bilhão em financiamento.
“Não podemos pensar em apostar apenas nesta vacina”, disse o ministro da Saúde da Itália, Roberto Speranza, em entrevista. “Mas esta é a vacina que nossos cientistas pensam que ficará pronta antes das outras. Neste momento, não há nenhuma outra empresa dizendo que poderíamos ter a vacina até o final do ano”.
Speranza, em uma visita ao laboratório, disse aos funcionários da empresa que “esta vacina pode estar entre as mais promissoras. Fico arrepiado ao pensar que estamos falando da chance de salvar vidas humanas”.
Na corrida global pela vacina contra o novo coronavírus, mais de 100 laboratórios, universidades e empresas farmacêuticas iniciaram missões experimentais. Mas apenas 11 potenciais vacinas, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), atingiram o estágio de testes clínicos. A OMS diz que apenas a vacina da Universidade de Oxford atingiu o que é conhecido como Fase III, o teste final e de maior escala.
As ampolas produzidas neste elegante campus de ciências nos arredores de Roma estão sendo usadas agora nesses ensaios, que estão ocorrendo na Grã-Bretanha. A AstraZeneca também obteve aprovação para realizar um experimento no Brasil, buscando voluntários em partes do mundo onde a pandemia está em andamento. A Advent também está produzindo um lote de doses que serão usadas em testes em vários países africanos.
O laboratório de Oxford teve uma vantagem inicial porque já estava trabalhando em uma vacina com estilo semelhante para Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS), outro tipo de coronavírus que foi detectado pela primeira vez na Arábia Saudita em 2012. Oxford diz que sua nova vacina em potencial para a Covid-19 mostrou-se eficaz e segura com macacos rhesus durante o estágio inicial do experimento.
“Há uma forte probabilidade de que a vacina funcione”, disse Walter Ricciardi, consultor do governo italiano da OMS.
Mas a vacina está longe de ser uma certeza, de acordo com especialistas.
Pode não funcionar ou pode permitir a inoculação em apenas alguns dos que a receberem. Mesmo quando a vacina chegar ao mercado, continuaremos sem saber se ela oferecerá proteção a longo prazo ou apenas por um ano ou dois. De qualquer maneira, o mundo precisará de mais de uma vacina, pois a demanda vai além do que qualquer empresa poderia produzir.
“A expectativa é que tenhamos uma vacina preventiva. Provavelmente mais de uma”, disse Antonio Cassone, ex-chefe do departamento de doenças infecciosas do Instituto Nacional de Saúde da Itália. “Mas ninguém saberá, quando ela for aplicada, quanto tempo a proteção vai durar. Não sabemos a duração do anticorpo. Este será mais um salto para o desconhecido”.