Sábado, 14 de dezembro de 2024
Por Edson Bündchen | 11 de julho de 2024
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Nunca vivemos tanto. Poucos lembram, mas é sempre bom recordar que a expectativa de vida aumentou significativamente em todo o mundo. Quando as Nações Unidas passaram a compilar dados globais, em 1960, os nascidos naquele ano esperavam viver até os 52,5 anos de idade. Hoje, a média global já ultrapassa os 73 anos e as projeções da ONU é que atingiremos 77 anos de expectativa média de vida até meados deste século. Joe Biden, atual Presidente americano, completará 82 anos em novembro próximo. Por obra dele o assunto idade ganhou destaque após o debate entre os presidenciáveis à Casa Branca, no último dia 27.06.2024, quando o candidato democrata apresentou problemas indisfarçáveis de comunicação, gestos e postura, tomados por alguns como sintomas de senilidade.
A questão não é trivial. Jornais importantes como o “The New York Times”, por exemplo, pediram que Biden renuncie a sua candidatura, dando a dimensão da gravidade do problema enfrentado pelo partido democrata às vésperas da eleição mais importante do planeta. E tudo isso ocorrendo num momento de exacerbadas tensões no mundo, com os EUA sendo fustigados pelas ambições chinesas, o caldeirão geopolítico fervendo na irresolvida guerra na Ucrânia e com Netanyahu retaliando o ataque terrorista do Hamas em doses superlativas, até para a sempre presente boa vontade americana.
Feitas as considerações mais estratégicas, é preciso também reconhecer um outro viés que transcende o episódio pontual das gafes e lapsos de memória do atual Presidente americano. O etarismo, por exemplo, emerge como um tema inescapável no momento em que o mundo, pelo menos em sua parte desenvolvida, vê a sua população envelhecer rapidamente e demandar todo um novo conjunto de políticas previdenciárias e de saúde que certamente impactarão de modo profundo a estrutura social e econômica dos países. Assim, admitir e normalizar o preconceito contra os mais velhos é piorar um problema que já é complexo em sua natureza. Ao contrário disso, integrar uma população idosa crescentemente representativa, dando-lhes respeito e dignidade deve ser o caminho a ser perseguido. Contudo, essa atenção e cuidado são desafios não somente estatais, mas de toda a sociedade. O atual contraste, porém, entre uma dinâmica econômica fortemente ancorada em novas tecnologias que premiam a velocidade, a competição e o imediatismo, dificultam o trabalho de inserção laboral da terceira idade e tornam ainda mais delicada e urgente a questão.
Nesse contexto extremamente desafiador, vergonhosamente convive-se também com a chaga do preconceito contra os mais velhos, talvez uma das mais insidiosas e perturbadoras características humanas, uma vez embutir ausência de empatia, sensibilidade e senso humanitário. Assim como a agressividade, o preconceito é endêmico à natureza humana. Ele cresce e flui com as mudanças nas condições sociais. Mesmo podendo ser desestimulado por normas acordadas e leis antidiscriminação, o fenômeno nunca desaparece totalmente. O estereótipo de que determinada pessoa está “velha demais” para certos afazeres ou responsabilidades, embora na maioria das vezes injusto, advém da necessidade de narrativas simplificadoras que categorizam algumas situações que possam economizar tempo e energia para a sobrevivência humana num ambiente bastante severo e competitivo.
Sem desconsiderar o aspecto utilitarista do viés do estereótipo sob o argumento evolutivo, o fato é que a ascensão de uma sociedade predominantemente idosa, ao par de sinalizar gigantescos desafios políticos, sociais e econômicos, sugere impor também uma dose extra de empatia e solidariedade. Será preciso superar o lado sombrio da fria estereotipagem, na qual velhos são inúteis, o que definitivamente apenas justifica a discriminação e gera conflitos, por um olhar mais acolhedor e humanizado. Sem essa consideração, estaremos submetendo os nossos idosos a uma imperdoável ausência de respeito e gratidão, atitude inconcebível para qualquer sociedade dita civilizada.
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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