Sábado, 09 de agosto de 2025
Por Redação O Sul | 8 de agosto de 2025
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou de forma sigilosa uma diretriz que autoriza o Pentágono a empregar militares em ações contra determinados cartéis de drogas da América Latina classificados por sua administração de organizações terroristas, segundo autoridades próximas à discussão ouvidas pelo jornal The New York Times.
A medida é uma das mais agressivas escaladas do governo republicano na guerra às drogas, uma vez que amplia o papel das Forças Armadas em funções tradicionalmente atribuídas a agentes de aplicação da lei —forças policiais, no geral. Entre os objetivos, está conter o fluxo de fentanil —responsável por uma crise de opioides no país— e outras drogas ilegais.
Ainda não está claro como e quando essa autorização pode ser aplicada, mas a nova diretriz de Trump parece visar, segundo o jornal americano, uma abordagem opressiva de capturar ou matar pessoas diretamente envolvidas no tráfico. Especialistas ouvidos pelo jornal afirmam que a medida ainda deve gerar questionamentos jurídicos, especialmente se envolver expressamente o uso letal da força fora de conflitos armados autorizados pelo Congresso —como seria o caso em territórios dominados pelos cartéis.
Segundo as autoridades, líderes militares americanos já avaliam cenários para eventuais ações, embora não haja confirmação de planos concretos ou datas. A diretriz é parte de um conjunto de iniciativas adotadas por Trump desde o início de seu segundo mandato, quando determinou que o Departamento de Estado classificasse formalmente alguns dos cartéis latino-americanos como organizações terroristas estrangeiras —entre eles o Tren de Aragua e o MS-13. Há também um movimento para que facções brasileiras, como o PCC e o CV, recebam essa classificação.
Mais recentemente, há duas semanas, o governo Trump incluiu o Cartel de los Soles na mesma lista, e afirmou que ele é comandado pelo ditador venezuelano Nicolás Maduro e outros altos funcionários de seu gabinete —declaração posteriormente rechaçada pela presidente do México, Claudia Sheinbaum. Na esteira dessa classificação, nesta quinta, a gestão americana anunciou que dobrou de US$ 25 milhões para US$ 50 milhões (R$ 273,1 milhões) a recompensa por informações que levem à prisão de Maduro.
Nessa sexta, Sheinbaum disse que militares americanos não entrarão em território mexicano e que “não há risco” de intervenção dos EUA no México.
Historicamente, o uso das Forças Armadas americanas em ações antidrogas na América Latina, comum especialmente na Colômbia e na América Central, se dava sob a justificativa de apoio a autoridades policiais, como em treinamentos conjuntos e fornecimento de equipamentos. A nova medida, no entanto, abre espaço para um papel mais ativo, com possibilidade de captura ou neutralização direta de alvos, o que especialistas em direito internacional alertam poder configurar violação de normas globais —especialmente se ocorrer de maneira unilateral, sem consentimento dos países envolvidos.
O precedente mais próximo data de 1989, quando o então presidente George H. W. Bush enviou tropas ao Panamá para prender Manuel Noriega, ação posteriormente condenada pela ONU como violação flagrante do direito internacional. Mais recentemente, nos anos 1990 e 2000, militares americanos atuaram no combate ao narcotráfico na Colômbia e no Peru principalmente com o compartilhamento de informações. As medidas foram suspensas e reformuladas à época, porém, para evitar a participação direta em confrontos.
No âmbito doméstico, para além da proibição de que militares exerçam funções policiais —com raras exceções—, há restrições legais previstas nas quais esbarra a ação de Trump. O Congresso já autorizou anteriormente o uso da força contra a Al-Qaeda após os atentados de 11 de setembro de 2001, mas isso não se estende a todos os grupos que o Executivo classifica de terroristas.
Uma possível ação justificada por este viés implicaria recorrer ao argumento de que o presidente tem autoridade constitucional para agir em autodefesa nacional —neste caso, possivelmente afirmando haver relação com a crise do uso de fentanil. Ainda é incerto, porém, quais regras deverão reger as ações militares contra cartéis.
A decisão de Trump também ocorre em meio a mudanças no aparato jurídico do Pentágono. Em fevereiro, o secretário de Defesa, Pete Hegseth, demitiu os principais advogados militares de cada força, responsáveis por avaliar a legalidade de operações, e, em paralelo, o governo tem reduzido o peso do Escritório de Assessoria Jurídica, órgão que tradicionalmente atua como freio a iniciativas potencialmente controversas.
No contexto político em que Trump monta sua Presidência, essa iniciativa reforça a narrativa de que o republicano identifica nos cartéis um inimigo central de seu governo, tanto no discurso interno, voltado para a crise de opioides e imigração, quanto na política externa, em especial contra regimes hostis a Washington. As informações são do jornal Folha de S.Paulo.