Domingo, 24 de agosto de 2025
Por Redação O Sul | 23 de agosto de 2025
A investigação que apontou tentativa do ex-presidente Jair Bolsonaro de interferir no processo da trama golpista no Supremo Tribunal Federal (STF) expôs as fissuras da direita do País a cerca de um ano das eleições em que tentarão voltar ao poder. Enquanto dirigentes do PL e de partidos como União Brasil, PP e Republicanos buscam um nome de consenso para chegar na disputa com chances de evitar a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mensagens apreendidas pela Polícia Federal mostram uma ofensiva do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) para descredenciar o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, como quem poderia ocupar esse posto.
Além disso, as conversas reveladas no relatório do inquérito evidenciam o uso do tarifaço imposto ao Brasil pelo governo de Donald Trump como barganha para livrar o ex-presidente de punições.
Ao longo da apuração, que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes, a PF reuniu mensagens em que Eduardo admite ao pai ter atuado nos EUA para enfraquecer a ideia de que o governador seria o seu sucessor na disputa pelo Palácio do Planalto. Além de Tarcísio, o próprio Eduardo é um dos cotados como possíveis nomes para substituir nas urnas Bolsonaro, que está inelegível até 2030.
“Aqui nos EUA tivemos que driblar a ideia plantada pelos aliados dele, de que ‘Tarcísio = Bolsonaro’, uma clara mensagem de que os EUA não precisariam entrar nesta briga, pois com TF (Tarcísio) ou vc Trump teria um aliado na presidência do Brasil em 2027”, escreve Eduardo ao pai em 11 de julho deste ano. O diálogo foi provocado pela publicação de uma reportagem sobre reunião do governador com o encarregado de negócio dos Estados Unidos, Gabriel Escobar, e pedido a revisão do tarifaço.
Em outra mensagem, o filho de Bolsonaro acrescenta: “Só para te deixar ciente: Tarcísio nunca te ajudou em nada no STF. Sempre esteve de braço cruzado vendo vc se fuder e se aquecendo para 2026.”
A disputa nos bastidores entre Eduardo e Tarcísio também rendeu xingamentos do deputado ao pai. Após o ex-presidente chamar o filho de “imaturo” por ter criticado a atuação do governador em relação ao tarifaço, o parlamentar envia uma mensagem o insultando. “Eu ia deixar de lado a história do Tarcísio, mas graça aos elogios que você fez a mim no Poder360, estou pensando seriamente em dar mais uma porrada nele, para ver se você aprende. VTNC, SEU INGRATO DO CARALHO! Me fudendo aqui (nos EUA)! Você ainda te ajuda e se fuder daí!”, escreveu Eduardo em 15 de julho.
Eduardo se mudou para os EUA em fevereiro e tem se reunido com autoridades ligadas ao governo americano para defender sanções ao Brasil sob o argumento de que o pai é alvo de uma perseguição política. Ele e Bolsonaro foram indiciados na quarta-feira pela PF pelos crimes de coação de autoridades na ação penal do golpe e por tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito.
Em nota, os advogados do ex-presidente afirmaram na quinta-feira ter recebido o indiciamento “com surpresa”. Eduardo, por sua vez, diz que a sua “atuação nos EUA jamais teve como objetivo interferir em qualquer processo em curso no Brasil”.
Questionado durante compromisso no interior paulista a respeito das mensagens, Tarcísio minimizou e tratou como questão “privada”: “Primeiro, não vou comentar uma conversa privada de pai para filho. É uma questão que só interessa aos dois, e eu não sei nem porque essas conversas foram divulgadas. Segundo, a minha relação com o Bolsonaro vai ser como sempre foi: relação de lealdade, de amizade, de gratidão com uma pessoa que eu entendo fez muito pelo Brasil e fez muito por mim. Me abriu a porta, sempre foi muito amigo e eu vou ser amigo, vou estar sempre do lado, vou estar sempre trabalhando para ajudar na medida do possível.”
As conversas de Bolsonaro com o filho e com o pastor Silas Malafaia, também investigado no caso, mostram como as tarifas impostas pelos EUA foram utilizadas para pressionar por uma anistia direcionada ao próprio ex-presidente. A estratégia foi evidenciada em mensagem enviada por Eduardo ao pai em 7 de julho, no mesmo dia em que Trump fez uma publicação criticando o processo criminal contra o aliado.
O deputado considerou que uma “anistia light”, que beneficiaria apenas os executores do 8 de Janeiro, encerraria a “ajuda” dos EUA. Com isso, indicou que seria necessária uma medida mais ampla, que beneficiaria Bolsonaro também. “Se a anistia light passar, a última ajuda vinda dos EUA terá sido o post do Trump. Eles não irão mais ajudar. Temos que decidir entre ajudar o Brasil, brecar o STF e resgatar a democracia OU enviar o pessoal que esteve num protesto que evoluiu para uma baderna para casa num semiaberto”, escreveu Eduardo, na ocasião.
Segundo o parlamentar, Bolsonaro corria o risco de ficar sem o “amparo dos EUA” e acabar “igualmente condenado no fim de agosto”. Dois dias depois, Trump anunciou o tarifaço e citou o julgamento de Bolsonaro como um dos motivos.
Na semana seguinte, a sobretaxa foi tema de uma conversa entre Bolsonaro e Malafaia. O pastor defendeu “pressionar o STF dizendo que, se houver uma anistia ampla e total, a tarifa vai ser suspensa”. Bolsonaro respondeu com o mesmo raciocínio, afirmando, em mensagem de áudio, que sem a votação de anistia não haveria uma negociação: “O que eu mais tenho feito, Malafaia, é conversar com pessoas mais acertadas, vamos assim dizer, no tocante de que se não começar votando a anistia não tem negociação sobre tarifa. Não adianta um ou outro governador querer ir pros Estados Unidos ou para embaixada tentar sensibilizar. Não vai conseguir.”
Em seguida, Malafaia afirma que o ex-presidente deve se pronunciar alegando que “é só resolver a questão da anistia que isso acaba”. “Você pode colocar, sim, e deve: ‘Olha, minha gente, a questão da tarifa de Donald Trump não tem a ver com a economia. Tem a ver com liberdade e justiça. Eu não quero ver retaliações sobre ministros do STF e suas famílias. Eu não quero ver isso. É só resolver a questão da anistia que isso acaba’.” As informações são do jornal O Globo.